Dependência para a independência!, por Silvio Giusti

Quando nos remetemos às origens do cooperativismo, em especial, aos registros sobre o movimento de Rochdale na Inglaterra e até mesmo sobre as aspirações de Raiffeisen na Alemanha, identificamos claramente, dentre os objetivos, a proposta de superar as enormes dificuldades da época por meio do esforço coletivo e organizado.

Na ideia de que as pessoas não ficassem sujeitas de forma impositiva às agruras do mercado e das condições de exploração e abusos daquele tempo, mas sim, que tivessem capacidades de criarem suas próprias soluções, tomarem para si, sorte melhor, na direção de atenderem suas necessidades e expectativas, de acessarem oportunidades e uma condição de vida mais digna, melhor e mais próxima da prosperidade, do que das injustiças e desigualdades as quais estavam cercados.

Assim, a busca por não ficar totalmente sujeito às eventuais imposições perniciosas do mercado, significa, de certa forma, a busca pela independência do indivíduo perante o mercado, a fim de que ele tenha condições adequadas para não precisar se submeter àquilo que eventualmente possa lhe prejudicar. Contudo, esta independência, no meio cooperativo, possui uma interessante dinâmica que é a de conjugar esforços com outros indivíduos, tendo objetivos comuns, assim, cria-se naturalmente um processo de dependência entre as pessoas, pois precisarão umas das outras para criarem suas soluções e transformarem suas realidades.

Portanto, há aí, uma clara situação de dependência, mas essa dependência, diferente de outras situações, no ambiente cooperativo, ao invés de ser algo prejudicial, se torna uma das grandes fortalezas do cooperativismo.

Afinal é desta dependência quista, desejosa, comungada, organizada e propositiva que é possível no cooperativismo transformar o indivíduo no coletivo, e partindo disto é que se multiplica as chances e possibilidades de resultados melhores, por meio da participação, inteligência, estratégia, ações e objetivos alcançados de forma coletiva.

O desdobramento eficiente dessa dinâmica coletiva no cooperativismo tende a produzir efeitos que projetarão uma melhor condição para o grupo e para os indivíduos, traduzindo assim, em uma condição de maior autonomia socioeconômico e financeira, elevando sua independência diante do mercado.

O patamar dessa independência, ou seja, o tamanho desse resultado individual, maior ou menor, vem da força e eficiência do conjunto, portanto, está ligado de forma determinante ao quanto cada um dos indivíduos está desperto e disposto a atuar de forma consciente e coletiva, de forma que suas dependências mútuas, organizadas e propositivas produzam outras soluções, novas oportunidades, criem condições, transformem realidades e multipliquem a prosperidade local.

Portanto, determinante será a capacidade de percepção do indivíduo sobre sua interligação/dependência com os demais, para atingir sua independência. Mas para atingir este objetivo é necessário mirar paralelamente em outro objetivo tão importante quanto, que é mirar no objetivo de alcançar a prosperidade do coletivo tendo certeza de que os reflexos desdobrarão na independência de cada uma das partes, por meio da dependência de todas as partes.

Olhando para trás nossa evolução enquanto seres humanos deixa clara a relevância da atuação em grupo, da dependência e interdependência, contudo, mesmo com tamanha importância, o tema volta e meia fica sujeito a outros planos que não o primeiro.

O olhar para o futuro e nossa sustentabilidade, são imperiosos em nos recordar acerca da necessidade de resgatarmos e darmos a devida relevância para nossa vida em sociedade e suas conexões.

Em nós, o desejo mestre e pai de tantos outros, é o desejo por nossa felicidade particular (indivíduo). De origem mais sublime, há outro desejo tão relevante, o desejo pela felicidade pública (coletivo). O primeiro, nasce de nossa natureza. Já o segundo, tem por mãe e surge de nossas virtudes. Pensamento do sacerdote e filósofo italiano Ludovico Muratori, ao qual concordo.

Diante disso, o cooperativismo tem a capacidade de empoderar as pessoas e as suas comunidades, a tal ponto de desafiar as estruturas e o modo de operação dos mercados convencionais, mas não na ideia do (desnecessário) confronto digladiante, e sim, na ideia de demonstrar e inspirar as pessoas e as sociedades de que é possível compartilhar a jornada, desde suas aspirações embrionárias, passando pelos processos de escolhas e decisões, até os seus efetivos resultados coletivos. Irmanados pelo eu e pelo nós! Pela natureza e pela virtude!

Por Silvio Giusti

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