Cooperativas de Crédito devem voltar atenções à Governança, por Elisa Simão

O Cooperativismo de Crédito vem demonstrado consecutivos resultados positivos no Brasil. Conforme números divulgados pelo Sistema Nacional de Crédito Cooperativo, (SNCC), do Banco Central (Bacen) segue acima da média do Sistema Financeiro Nacional (SFN). Em junho 2022, mesmo diante de uma leve desaceleração em relação aos índices de 2021, o crescimento em 12 meses da carteira de crédito do SNCC foi de 29%, frente a 17% do restante do SFN, evidenciando o aquecimento do setor.

Quando há crescimento, há também oportunidades de melhorias na gestão. Atrelado a este momento, em agosto de 2022, foi promulgada a Lei Complementar 196, que modificou parte da LC 130, de 2009, atualização que incide, entre outros aspectos, sobre o da governança nas cooperativas de crédito. Neste sentido, elementos motivadores da nova legislação são a continuidade da ampliação da participação do SNCC no SFN, a fim de ampliar a acessibilidade ao crédito no País, e o desenvolvimento e operacionalização de negócios e novas soluções em um mercado mais digital.

Na nova legislação, a chamada Governança Dual se tornou mandatória para todas as cooperativas, inclusive para confederações de serviço, o que se traduz na obrigatoriedade de composição de um Conselho de Administração e uma Diretoria Executiva a ele subordinada. A exceção se dá nos casos de instituições de menor porte, com média dos ativos totais nos três últimos exercícios sociais inferior a 50 milhões de reais e pela cooperativa de crédito de capital e empréstimo, as quais que seguem autorizadas a possuir estruturas mais sucintas,

Foi determinada também a cooperativas financeiras e fundos garantidores a vedação do acúmulo dos cargos de presidente e vice-presidente do conselho e diretor-executivo no mesmo sistema cooperativo nos diferentes níveis da organização sistêmica – singular, central e confederação. Esta vedação também se aplica aos cargos de presidente e vice-presidente e diretor executivo dos fundos garantidores. Apesar desta mudança, os mandatos iniciados antes da vigência da LC 196 poderão ser finalizados na data prevista previamente à publicação da lei.

Há a possibilidade, em caráter excepcional, da acumulação de cargo em Diretoria Executiva. Esse dispositivo tem o propósito de endereçar determinadas obrigações sistêmicas, mas não o acúmulo das atividades/funções operacionais. Ou seja, um diretor tem a responsabilidade de aplicação de determinadas políticas em nível sistêmico. Ademais, não é mais permitida a função de suplência nos Conselhos de Administração.

Apesar de até o presente momento não haver regulamentação desta faculdade, o Conselho Monetário Nacional poderá admitir a contratação de conselheiro de administração independente não associado, na forma prevista no estatuto social, mantendo-se a obrigatoriedade da maioria do Conselho de Administração ser formada por pessoas naturais associadas à cooperativa de crédito. Além disso, o Conselho de Administração passa a remuneração fixa de Diretoria Executiva e a aprovação da política de remuneração passa a se fazer necessária pela assembleia geral no início de cada mandato no mínimo.

Já o Conselho Fiscal passa a ser facultativo. Para as cooperativas que possuem Governança Dual, mediante aprovação em assembleia geral, poderá haver a destituição do Conselho Fiscal, deixando o Conselho de Administração da cooperativa delegado por fiscalizar os atos da Diretoria Executiva. A medida ainda interfere significativamente nas regras dos processos de desfiliação de cooperativas, bem como possibilita uma central intervir (também chamado cogestão) em uma singular ou de uma confederação intervir em uma central, mediante aprovação do Banco Central, quando houver indício de que a gestão atual esteja causando ou possa vir a causar perdas aos associados. Os requisitos para haver a aprovação pelo Banco Central sempre que houver o requerimento de uma intervenção serão definidos em regulamentação específica do CMN.

Todas estas mudanças e regulamentações demonstram o quanto o desenvolvimento quase que progressivo das cooperativas de crédito está diretamente associado à necessidade de se aperfeiçoar processos de governança. Não por coincidência, a dimensão de governança é a mais extensa e com temas de maior relevância na LC 196. Por conta disso, é a que merece maior atenção por parte do ramo do Cooperativismo de Crédito. Se num primeiro momento exigirá uma maior atenção e diligências por parte das instituições, a médio e longo prazos, os benefícios serão certamente recompensadores.

Elisa Simão é Sócia da PwC Brasil, Líder do Centro de Excelência para Cooperativas de Crédito

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