Indicador de qualidade cadastral frente ao Risco, por Ricardo Coelho

Entre uma conexão aérea e outra para atender a um cliente no interior de São Paulo, pude ler um livro que ganhei há algum tempo de um grande amigo. O livro tem em seu título algo que me identifico: A arte de ser insensato, do bilionário Eli Broad, que teve duas de suas empresas listadas entre as 500 maiores dos Estados Unidos (Fortune 500). Esse “insensato” livro conta com elogios de Bill Clinton e Bill Gates na contra capa. Isso, por si só, já seria um bom motivo para referendá-lo.

Entre tantas orientações “insensatas”, grifei no livro a seguinte: Desafio e recompensa constroem a lealdade. Ela tem uma enorme coerência com o que comumente é internalizado por nossos profissionais comerciais, que agem frente a seus desafios buscando recompensas, sem descuidar de construir um elevado grau de lealdade com seus empregadores.

Quão claro é o desafio? Precisamos sinalizar muitíssimo bem a nossos profissionais com que qualidade devem atingir esses desafios, para que possam fazer jus à recompensa, e a nossa lealdade. E um dos temas onde há pouca eficácia em todo o mercado financeiro é o esforço na qualificação de nossos cadastros, em especial daqueles clientes que apresentam posição devedora. Portanto, essa realidade também é um grande desafio para nossos líderes no cooperativismo de crédito.

Cadastro – foco primeiro no risco: Todos os clientes devem manter seus cadastros atualizados anualmente, como reza a Lei 9.613/98 (sobre Lavagem de dinheiro) e a Circular 3.461/09. Mas alguns clientes têm relacionamentos onde não há o risco creditício e, nesse caso, o risco eventual, por exemplo, pode advir de terem cadastros desatualizados, o que pode gerar apontamentos em auditorias. Assim, pela complexidade de mantermos atualizada a totalidade de nossos cadastros, o que é operacionalmente quase impossível, sugerimos focar esforços onde o cadastro desatualizado potencializa o risco efetivo de crédito, haja vista sua baixa qualidade nas informações.

Maior foco de atualização cadastral: Devemos prioritariamente despender esforços para que estejam atualizados os cadastros de clientes que tenham posição tomada conosco, pois é sabido que informação de qualidade é um rico recurso na gestão prudencial da carteira de crédito e/ou na eventualidade de conduzir uma cobrança ou negociação. Contudo, se, por algum motivo, nossa força de trabalho não conseguir manter atualizados os cadastros desses clientes devedores, devemos, então, criar maneiras de monitorar essa realidade para que eles sejam incentivados a corrigir esse descompasso gerencial. E uma das sugestões seria a implementação em cada agência (ou carteira) de um indicador que explicite a qualidade dos cadastros dos clientes tomadores.

Indicador de qualidade cadastral frente ao risco: Terá como denominador a totalidade de clientes com dívida ativa em crédito. E o numerador será a quantidade desses devedores que têm cadastro atualizado. Portanto, excluindo da fórmula todos os devedores com cadastros desatualizados.

Ex: Uma agência possui 2.700 clientes ativos, sendo 1.000 com posições ativas em crédito. Destes 1.000 devedores, apenas 860 estão com o cadastro atualizado.

Dessa forma, 86% é o indicador de qualidade cadastral frente ao risco: (860/1.000) * 100.

Observe que, apesar de terem dívidas ativas, 14% desses clientes devedores restantes estão com o cadastro desatualizado, impondo a Singular um risco acima do contábil e do desejado frente aos preceitos da Governança. O objetivo é, portanto, perseguir os 100% desse índice.

Abaixo apresentamos sugestões e outros pontos de atenção para qualificar sua política de cadastro:

a) Temos necessidade de definir, de forma única, em nosso modelo de negócio, como faremos o melhor uso das facilidades tecnológicas para atualizar nossos cadastros, de tal sorte que isso nos dê, além dos benefícios processuais e de relacionamento, a devida segurança legal e comercial. Assim, para tanto, devemos obter o formal consenso dessas regras por aqueles que venham a nos auditar (Resolução 4.480/16. Abertura e Encerramento de Contas de Depósito por meio eletrônico).

b) Cada unidade de negócio ou Singular poderia adotar critérios necessários para uma primorosa primeira confecção e atualização cadastrais, visando mitigar os riscos e maximizar as oportunidades comerciais. Isso seria um exemplo de como podemos melhorar nossa gestão do cadastro PF frente ao risco. Dessa forma, serão atualizados com primor os cadastros de clientes que solicitarem ou tiverem posições devedoras acima de 5 (cinco) vezes a sua renda declarada (ex.). Os clientes abaixo desse parâmetro poderiam ter seus cadastros atualizados com ajuda da tecnologia, respaldados pela Res. 4.480/16 e pelo entendimento formal da auditoria externa.

c) Cadastros de PJ devem ser feitos da forma convencional, atualizados semestralmente ou diante de uma nova demanda creditícia e, quando possível, precedido de visita. Clientes PJ definidos como MEI (Microempreendedor Individual), que tenham mais de três clientes, apesar do risco potencialmente baixo quanto a uma eventual perda, devem ter cadastros feitos com o mesmo rigor.

d) Cresce de forma exponencial os MEI com uma ou, no máximo, duas fontes pagadoras. Esses cadastros devem ser feitos com total atenção à fonte pagadora, já que, muito provavelmente, sinalizam que seja, efetivamente, um “funcionário” de uma empresa que se beneficia das novas modalidades legais, que visam suavizar a carga e o risco do “empregador”. Assim, se essa fonte pagadora perder liquidez, o efeito na vida desse MEI será o mesmo que se ele fosse um CLT ligado a essa empresa. E, consequentemente, esses riscos requerem mais atenção.

e) Os cadastros de clientes que sejam funcionários formais de qualquer empresa, mesmo que essas não sejam nossos clientes, devem ser monitorados para que, havendo uma queda na classificação nos rating desses CNPJ empregadores (ou mesmo Recuperações Judiciais), possamos agir de forma proativa, mitigando eventuais perdas pela deficiência de liquidez da fonte pagadora. Essa ação requer autorização para acessar essas informações, mas, caso não a tenhamos, a prática indica que é possível, também, obter essas informações por meio do convívio social onde compete nossa equipe.

f) As eventuais aceitações de atualizações de renda pelo extrato de outros bancos, volume de crédito recebido em nossa conta corrente, ou outra forma mais “dinâmica”, inclusive quanto à comprovação de endereço, entre outros, devem estar formalmente normatizados em nossos manuais e pela empresa que nos audita, evitando estressantes descompassos legais. Alegar que o concorrente já pratica tal procedimento não valida legalmente a nossa adesão a essas práticas.

g) As formas de autenticarmos os documentos que recebemos como “cópia do original” devem ser revistas quanto a sua efetiva utilidade frente à modernidade tecnológica e normatização do Banco Central. Contudo, havendo ainda, eventualmente, essa necessidade processual, que essa identificação seja clara, inclusive quanto à data e o profissional que recebeu a cópia.

h) Clientes com menor risco como aplicadores/poupadores, usuários apenas de conta corrente, ou que comprarem alguma solução de nossos parceiros, entre outros, podem, em tese, nesse momento, terem seus cadastros atualizados de forma interativa ao acessarem nossas soluções tecnológicas, confirmando endereço, telefone, renda etc. Tudo isso normatizado e apoiado pela auditoria.

i) Devem ser feitas com prudência a compra de serviços externos que visam lapidar nossos cadastros, usualmente denominados de: “validação”, “enriquecimento”, “higienização”, “mineração” etc., tendo em vista que esses provedores devem garantir a origem lícita desses dados, para que não sejamos corresponsáveis frente à Lei Geral Brasileira de Proteção de Dados.

j) Para a efetiva utilidade do cadastro, devemos analisar se as suas atualizações são feitas com eficácia, em especial quanto à renda/faturamento, participação acionária, patrimônio, condição marital, contatos etc. . Isso, pois, há indícios de sistemas que “facilitam” essa “formal” atualização.

k) Devemos ter sistemas proativos que apontem as diversas peculiaridades de um cadastro, em especial quanto à sua renovação, seguindo, por exemplo, alguns dos temas aqui propostos. Assim, previamente, nossa força de venda receberá sinalizações para suas ações, e conseguiremos construir uma política moderna e coerente de atualização cadastral. Etc..

Reflexões finais: Sugerimos inúmeras reflexões para que tenhamos uma melhor qualidade em nossos cadastros, e isso só será possível com o empenho de nosso pessoal. Assim sendo, recordemos Eli Broad quando nos orienta que o desafio e recompensa constroem a lealdade e contextualiza em seu livro porque nem cogita nada menos do que a melhor entrega de seus comandados.

É tácito que o Risco é algo que nos impõe um grande estresse, e o seu pilar, o cadastro, deve sempre ser repensado para que busquemos sua qualidade total, algo na prática quase impossível. Mas, pelo menos, que nesse primeiro momento, sejamos eficazes na atualização cadastral de nossos devedores.

Tendo isso em vista, o indicador de qualidade cadastral frente ao risco monitora de forma simples esse problema e favorece que atinjamos esse plausível desafio. E, melhorando esse indicador, nossos profissionais serão recompensados pela superação do desafio e obterão a nossa lealdade.

Esses e outras dezenas de temas serão abordados em nosso 6º Workshop de Crédito a ser realizado em Foz do Iguaçu/PR dias 11 e 12/07/2019. Programe-se! Solicite mais informações pelo contato abaixo.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento Comercial para o Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 13/05/2019

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